Entrevista com Brancco Langlada
Postado em 10 de julho de 2016
Como surgiu o seu interesse pela música?
Brancco Langlada – Da família de músicos. Sempre tive ótima escola cultural musical, pai baterista, tios violonistas e uma curiosidade enorme por entender o porquê daquela arte fazer aquele rebuliço nas sociedades e ao mesmo tempo no íntimo das pessoas. Dessas curiosidades, sobre a música e musicalidade veio o interesse pelo executar instrumentos. Minha avó Anita Penteado, catedrática do kardecismo, dizia que minha escolha por reencarnar nesta família havia sido esta: a afinidade com um bando de músicos, artistas e anarquistas que se ajuntavam naquela casa. Mas com certeza depois de adulto, optar pela música como forma de expressar minha arte foi algo inerente a minha vontade. Por quê? Não sei. Para quê? Estou prestes a descobrir.
Quais são suas influências?
Brancco – Eu me lembro de balbuciar JouJoux Balangandans com três anos de idade e naquelas melodias sussurradas por João Gilberto nas fitas K7 do Opala do “Seu João”, que diga-se de passagem o bom gosto musical foi das poucas boas coisas que meu pai me incutiu. Aos nove anos de idade eu chorei por não conseguir ir ao show do Kiss antes do Rock n Rio I, cresci ouvindo Tom Jobim, Rita Lee, Thelonious Monk, com 14 anos eu amava Beny Goodman e Big Bands, por influência da minha avó Theresinha Langlada aprendi a compreender e ouvir os movimentos das obras de Bach, Beethoven, Lizt. Sou ouvidor assíduo de Iron Maiden, Guns and Roses, Aerosmith, Black Sabbath, muito do Chico Buarque, Milton Nascimento, mas verdadeiramente quem transformou mesmo minha vida musical foi um disco, que ganhei em 1992 chamado Everything Happens to Me – Chet Baker e Kirk Lightsey trio, quando eu descobri a sonoridade a musicalidade e a genialidade do Chet Baker e toda aquela geração de músicos intimistas, eu realmente encontrei minha fonte para estudo, inspiração e aprendizado musical.
Você fez teologia, direito, pedagogia e odontologia. Não são áreas antagônicas?
Brancco – Teologia foi um curso muito intenso, depois de passar por alguns estudinhos em alguns locais como igrejas, alguns estudos sobre gnose. Minha avó Anita Penteado foi instrutora no Centro Espírita Caritas em Mogi das Cruzes por 40 anos, então desde cedo eu lia livros de pessoas como Zibia Gaspareto, psicografias apocalípticas como um livro que me lembro muito chamado Exilados de Capela, ou A Abadia dos Beneditinos, me fizeram ser curioso com o assunto filosofia minha outra avó me dava textos do Kant e textos do Voltaire. Quando já tinha algum conhecimento sobre catolicismo, mormonismo, cultos afro-brasileiros, fui vizinho do Padre Marcílio, conhecido por sua literatura sobre sincretismo religioso. Li bastante e mais ainda por mim mesmo e quando pensei que sabia alguma coisinha descobri que não tinha noção nenhuma de nada, então me decidi por procurar uma universidade e me identifiquei muito com o Instituto Presbiteriano Makenzie, como disse curso muito intenso infelizmente não o concluí, continuo sem saber de coisa nenhuma, mas tenho no meu peito os anos e as instruções que recebi dos mestres de lá. Li aprendi a enxergar um ser como humano, entendi que mau cheiro e condição social ruim não é privilégio de campanha publicitária. Aprendi ali que um abraço amigo desinteressado vale mais que um chocolate fino na frente da lareira de uma vida vazia. O Direito é um curso que deveria ser ensinado no ensino médio. Para quem estudou livros como Leviticus e Números (do Pentateuco) compreende que o CPC (código do processo civil) tem por onde ser como é (risos). Sinto muito não ter concluído o curso de Direito. Mas como autodidata os conhecimentos que adquiri ali me são úteis até hoje. Só não me arrependo de ter desistido do curso de Pedagogia, e não digo isso pelos mestres, mas sim pelos alunos. Odontologia foi o meu auge do desespero de querer cuidar das pessoas, acho que eu andava carente, querendo cuidar tanto de quem precisava de cuidado, carinho, atendimento, que eu me lembro que no primeiro semestre eu já estava enfiado na clínica da universidade. Essa necessidade de ensinar, cuidar é algo que talvez tenha herdado das minhas avós, pois que uma lecionava francês no Instituto de Educação Washington Luis e a outra kardecismo no Caritas. (Risos) Aliás todas as músicas do meu novo LP têm essa alcunha: transmitir algo que preste para que quem receba esse algo o receba e construa algo de valor, que o melhore da posição anterior, chamo de música positivista. Vou patentear (Risos).
Você toca vários instrumentos. É autodidata? Como assim?
Brancco – Não me digno a dizer que toco. Quem me dera. Eu estudo bastante, e tenho uma boa noção do que eu faço. Mas como me perguntou, sim eu ensino a mim mesmo, infelizmente meus pais não tinham condição de me dar instrumentos musicais quiçá pagar um cursinho ou um professor particular, então tive que me virar eu mesmo. Lendo bastante, procurando sempre uma orientação aqui, outra ali mas principalmente eu sempre tive a sorte de tocar com músicos muito bons, então quando eu percebi que sabia tocar o contra baixo eu saí tocando o contra baixo, mas aí eu estudava baixo no meu violão e percebi que se estudasse bem o violão eu tocaria bem o contrabaixo, e então saquei que para pular do violão para guitarra era um “pulin”, então o piano e a bateria se fizeram necessários, quando eu fui morar no interior de São Paulo e fiquei de 2009 a 2014 gravando um set de 30 músicas que são o meu primeiro disco, que está disponível online. Sempre dividi meus conhecimentos com quem quisesse, tivesse dinheiro para pagar minhas aulas ou não. O conhecimento não é meu, meu dever é transmitir a todos ao meu redor para que compartilhemos e façamos um bem maior com aquele conhecimento. Não é assim com a tal da internet? Eu penso que a vida deveria ser assim: um compartilhar intenso, afinal ninguém é um planeta isolado num universo solitário, por mais que você se isole, no seu conhecimento ou na sua ignorância, você só cresce quando se estica e encosta no outro e descobre seus limites e suas capacidades.
Como nascem suas composições?
Brancco – Nascem das influências filosóficas que eu tenho. Leio muito Pondé, os livros do Cortella são legais, sou admirador de pessoas como DR Russell Shedd, li muitos Watchman Nee, estudo Nietze, Martin Heidegger, e sou leitor inveterado da Bíblia, leio gosto muito e aprendo demais ali. Tive a sorte de crescer frequentando a biblioteca Benedito Servulo de Santana, que era situada no Casarão do Carmo, ali pude ler toda série enrola e desenrola, série vagalume, e muitos, mas muitos autores e estórias que formaram e formam até hoje a prosódia das minhas poesias, e transformam os ensinamentos das músicas em textos mais legais de se cantar junto ao se ouvir, afinal eu não falo sobre flores e borboletas apenas nas minhas canções. Este álbum As Mais Sinceras tem como inspiração a Geração Beatnik que fala muito mais sobre falta de caráter social do que coelhinhos e fadas propriamente ditos. (risos) Para esta obra estou me utilizando muito de Bukowski, Alen Grinsberg, que faria 90 anos esse ano, Jack Kerouac, The Doors, Animals, e esse meio aí… Tem que ouvir para entender melhor.
Tem algum gênero musical que te inspira mais?
Brancco – Me inspira o gênero musical que seja verdadeiro, que tenha verdade e profundidade. Que seja um tambor de lata tocado por um semi analfabeto ou que seja um xilofone tocado pelo Maestro Roberto Saltini num quarteto de música de câmara, se for verdadeiro, sem mentira, sem falsidade ou má intenção, música que não seja mercenária, essa sim me inspira. Me chateia um pouco essas porcarias “fabricadas” por produtoras que não transmitem nada além de uma onomatopeia ridícula tipo tchere tcherê xurú xurú berê berê e por aí vai, essas invenções visam bestializar o ouvinte a uma filosofia vazia, sem conteúdo, a música é até de qualidade…guitarras caras, estúdios top, mídia milionária… Mas ensina o quê? Transmite o quê? Mau exemplo? Sexo? Perversão???
Você vai gravar o disco “As Mais Sinceras”, no Estúdio Municipal de Mogi das
Cruzes. Como surgiu este projeto?
Brancco – O Projeto As Mais Sinceras surgiu da vontade de dar um grito pelo bom caráter e pelo positivismo pelo fim da polarização e pela unificação do ser com o humano, agregado a isso uma vontade imensa de resgatar a verdadeira música popular brasileira como ferramenta de estímulo ao bom caráter do brasileiro, feita por pessoas que vivem de música e fazem música brasileira, como nosso arranjador Paulo Higa, com mais de 50 anos de carreira musical, uma honra pra nós, como ter Flavio Dias de Oliveira dirigindo os shows, dirigindo o making of e em várias parcerias nas letras das músicas…. É para eu estar feliz ou não?
O seu projeto foi aprovado pela Lei de Incentivo à Cultura de Mogi das Cruzes. Foi
difícil?
Brancco – Não foi difícil, os trâmites são burocráticos. É necessário ter experiência e principalmente não ter preguiça de estudar leis e decretos. No caso do álbum As Mais Sinceras foi uma aprovação simples porque o projeto foi elaborado seguindo filosofia de trabalho, sob diretrizes e regras para que o conteúdo tivesse verdadeiro valor cultural e principalmente interesse público. Afinal desenvolver projeto para gastar dinheiro público qualquer um faz, mas, e fazer projeto que verdadeiramente tenha eficiência cultural e interesse público? Quem tem coragem? Aprovar projeto é coisa simples, a lei mogicruzense é tão bem elaborada, o decreto foi muito bem escrito por gente que conhece e sabe o que está fazendo, por isso a lei é simples de entender. Além disso tudo a Secretaria de Cultura de Mogi das Cruzes é muito prestativa, o pessoal é eficiente e explica tudo tim tim por tim tim, o site é intuitivo, tudo é acessível a todos. Mas não pense que é assim oba oba, vamos aprovar projetos. Se engana quem acha que incentivo é sinônimo de cabide de emprego. Existe uma CAP! Comissão de Análise de Projetos, se o seu projeto não tem interesse público não adianta choramingar, dinheiro público é muita responsabilidade, não pode ser tratado com leviandade.
Quem como uma empresa mogiana pode apoiar este projeto?
Brancco – Todos os mogicruzenses que recolhem IPTU e ISS podem destinar facilmente parte do valor pago em tributos a projetos aprovados pela LIC. Chamamos isso de renúncia fiscal. Funciona da seguinte forma: o interessado procura o administrador do projeto, no caso do álbum As Mais Sinceras pode entrar em contato pelo e-mail asmaissinceras@gmail.com e nós lhe enviaremos o formulário. Ele preenche e assina, três vias, juntamos certa documentação, dos recibos uma via fica com o patrocinador a outra vai para o projeto e a terceira via a Secretaria de Cultura de Mogi das Cruzes encaminha ao setor de contas da Prefeitura de Mogi das Cruzes que faz o repasse diretamente na conta bancária em nome do projeto. O patrocinador não tem que se cadastrar em nada, nem depositar dinheiro em conta de ninguém, basta pagar normalmente o seu tributo e encaminhar o comprovante para o projeto. Aqui pelo LIC nos gravaremos 18 músicas, 13 de autoria minha, em parceria com Flavio Dias, Percy Aires, Rui Ponciano, Eliezer e Rafa Crazy. Produziremos ainda um dvd do Makin Of da gravação do disco que terá convidados como Áurea Lombardi, Eliézer Ramos, Tania Melo, e mais uma tchurma que vai vir por aí. São 18 músicas. Vai ter bastante gente nessa empreitada, o disco vai ficar do balacobaco! (risos) Também pela LIC mogicruzense prensaremos 5 mil CDs que serão distribuídos gratuitamente nos 10 shows que se seguem pelo Estado de São Paulo
Paralelamente você teve o mesmo projeto aprovado pelo PROAC-ICMS em São Paulo para fazer 10 shows. Como foi este processo de aprovação?
Brancco – O processo foi ao contrário, primeiro o projeto nasceu com o PROAC ICMS e depois a LIC mogicruzense chegou até nós como uma enorme parceira na execução e melhoria do projeto As Mais Sinceras, e também da necessidade de levar música de alta qualidade musical, com alto valor filosófico e cultural a lugares onde eu já vivi e pude detectar que música boa no dia a dia transforma o caráter de uma nação, assim como música ruim destrói o caráter de uma nação! Através do PROAC ICMS conseguimos aprovar a captação de verba para uma tour de 10 shows que circulará por dez cidades diferentes dentro do estado de São Paulo, com música positivista de alto teor filosófico e usando o construtivismo piagetiano, o qual eu me identifico demais, o governo do estado enxergou o valor cultural e a necessidade de execução do álbum As Mais Sinceras como forma de transformação do caráter social, e agora iremos circular por essas dez cidades com esse repertório, os shows serão com entrada gratuita e os ingressos serão distribuídos em escolas e universidades, serão 500 CDs-ingresso em cada cidade, onde o ouvinte experimentará as guitarras de músicos como Sócrates Noronha, que veio do Guarujá e, depois de mais de 20 anos de amizade, nós dois vamos dividir os palcos, guitarrista impressionante acompanhado das jovens mas não menos poderosas cordas das guitarras do Nathan Penteado, o Robson Nascimento veio acrescentar na bateria com mais de 15 anos de estrada e o nosso mais recém adquirido na banda o Rennan Soares que se enveredou pelos contrabaixos e tem feito um serviço de primeira na banda.
Quem e como as empresas podem apoiar a cultura através deste projeto?
Brancco – Os shows, diferentemente dos cinco mil CDs, podem ser patrocinados através da renúncia fiscal do ICMS, ou seja, qualquer firma do Estado de São Paulo que recolha ICMS pode destinar uma parte para projetos culturais. Essa modalidade de patrocínio requer inscrição no site da SEFAZ. Não é complicado nem dolorido, nós damos todo suporte necessário e ainda veicula a marca do empresário a um projeto sério com profissionais de ponta envolvidos e que com certeza vai trazer simpatia e positivismo as marcas envolvidas. Afinal fazemos um trabalho sério e queremos semear nossas sementes em locais férteis.
JOGO RÁPIDO
Um lugar
Minha casa
Um cheiro
Terra
Uma cor
Cobalto
Um filme
Posso falar todos do Kurosawa??
Um livro
Bíblia, ali tem 66
Um momento
Quando me enxerguei dentro daqueles olhos, castanhos
Uma música
Everything Happens To Me, mas na versão do Kirk Lightsey trio
Um homem
Jesus
Uma mulher
Minha irmã Ana Alice
Deus
É tudo